sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Só o humor salva [2]





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* são 5h11 e as opções que tenho são: ( ) comer; ( ) beber; ( ) calçar meus tênis e sair pra caminhar; ( ) ler; ( ) pensar que minha insônia tornou-se crônica e vem arruinando, progressivamente, com meus poucos neurônios, minha memória, minha forma física, minha cútis, minha energia, meu trabalho e minha vida pessoal; ( ) chorar; ( ) tomar um relaxante e ir pra cama; (X) antes, fazer uma piadinha de mim mesma porque a barra pesou...

Nua e crua



"Algum tempo atrás, talvez uns dias, eu era uma moça caminhando por um mundo de cores, com formas claras e tangíveis. Tudo era misterioso e havia algo oculto; adivinhar a natureza era um jogo para mim. Se você soubesse como é terrível obter o conhecimento de repente - como um relâmpago iluminando a Terra! Agora, vivo num planeta doloroso, transparente como gelo. É como se houvesse aprendido tudo de uma vez, numa questão de segundos. Minhas amigas e colegas tornaram-se mulheres lentamente. Eu envelheci em instantes e agora tudo está embotado e plano. Sei que não há nada escondido; se houvesse, eu veria."



Frida Kahlo





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* "Uma porção de Verdade, por favor. Ao ponto!" E o garçom se afasta, retrucando: "Verdade de verdade, só mal passada, meu senhor. A Verdade é uma mulher velha e nua - tirando a pele ressecada que a cobre, a carne que sobra é dura de roer..."  

Em busca do tempo perdido



  • o curta Destino, lançado em 2003 é uma colaboração entre o animador americano Walt Disney e o pintor espanhol Salvador Dalí
  • singular, não só pela parceria, mas especialmente pela produção:
  • iniciado em 1945, só foi finalizado 58 anos depois!
  • Dalí chegou a criar uma série de storyboards e estudos, mas por conta de dificuldades financeiras o projeto foi engavetado;
  • em 1999, Roy Disney ressuscitou a ideia e convocou o animador francês Dominique Monfréy (o mesmo de Tarzan)
  • Monfréy conseguiu capturar os devaneios simbólicos de pintor espanhol nesta leitura do mito grego Cronos e seu amor por uma mortal.
  • uma curiosidade: a seqüência de 17 segundos (com duas tartarugas) é o único trecho animado originalmente em 1945
  • outra pérola que foi salva da etapa inicial do projeto é o tema musical escrito pelo compositor mexicano Armando Dominguez 
  • e interpretado pela poderosa voz da cantora Dora Luz (a mesma da animação Você já foi a Bahia?, de 1944)
  • o curta entrou nos extras de Fantasia 2000 lançado em 2010.




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* correndo contra o relógio para dar conta de todos os compromissos firmados para este final de ano, passo por aqui, feito o coelho de Alice, só a tempo de confessar este meu reles desejo mortal: ter o deus do tempo por mim apaixonado [não para tornar-me deusa e viver eternamente, mas para ter a face juvenil - plena de vida, esperanças, volúpia e paixão - para sempre congelada] ** o tempo foi curto até para alterar o texto original, que copiei cartesianamente do macacomalandro.

domingo, 18 de novembro de 2012

O deus que dança


  • o deus russo, inquebrantável - Mikhail Baryshnikov, o Grande - em cena de O Sol da Meia Noite (aliás, Mikka é feito John, o Travolta, que dança caminhando, dança sorrindo, dança com os olhos, dança com um, dois dedos da mão, dança enquanto vive, dança... porque o mundo gira) 



  • em homenagem ao onipresente deus de ébano, Michael Jackson, uma seleção de incríveis: Sammy Davis Jr, Fred Astaire, Cab Calloway, Clark Brothers, Daniel L. Haynes, Rubberneck Holmes, Patterson and Jackson, Bill Robinson, Three Chefs (somente os pés), Ray Winfield, Earl Snakehips Tucker (e, uma única mulher, Eleanor Powell)


  • os deuses que, além de dançar, cantam! (do mesmo panteão, onde Elvis the Pelvis reina absoluto) 
   
  • os deuses africanos do soul! (minha dica: se conseguir abstrair da montação, vai facilmente reparar que as meninas lubrificaram as articulações e os meninos simplesmente as esqueceram em casa, junto com os ossos...)
   
  • Anthony Lee e seus alunos, do grupo novaiorquino Kinjazz: deuses orientais da engenhosidade
   




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* há alguma coisa no corpo masculino em movimento de dança que me eletrifica, eriça meus pelos, estupidifica meu olhar e me deixa tontinha... mas vou tentar intelectualizar: "Eu só poderia crer num Deus que soubesse dançar, é o que afirma Nietzsche, em Assim Falou Zaratustra. E eu também. Penso que só um Deus que sabe dançar possibilita a vida com leveza, baseada no presente, sem que precisemos nos submeter à tradições anacrônicas, ou nos refugiarmos em esperanças futuras. Deus que dança é o que se movimenta com a vida que Ele engendra no mundo, e não aquele que se imobiliza e profere um mundo falso, uma vida pecaminosa e cheia de culpa para nos fazer fugir da responsabilidade de vivê-la e nos refugiarmos na esperança de uma outra vida. O Deus que dança não quer que fujamos das contradições de estarmos vivos, quer que assumamos a responsabilidade de enfrentarmos essas contradições. Por conceber um deus morto, fixo, imutável e carrancudo, a moralidade ocidental procurou nos afastar de nossa totalidade negando a vida e procurando solução para o devir através de vãs esperanças numa vida além" (Gilberto Miranda Jr).

terça-feira, 13 de novembro de 2012

No princípio era o verbo

  





Ela disse:
- Sabíamos que o fim estava próximo, por isso pusemos tudo num poema, para contar ao universo quem éramos, por que estávamos aqui e o que dizíamos, fazíamos, pensávamos, sonhávamos e desejávamos. Embrulhamos nossos sonhos em palavras e moldamos as palavras pra que vivessem para sempre, inesquecíveis. Depois enviamos o poema como um padrão de fluxo, para aguardar no coração de uma estrela, emitindo sua mensagem em pulsos, erupções e chiados por todo o espectro eletromagnético, até que, em mundos a mil sistemas solares dali, o padrão fosse decodificado e lido, e se tornasse um poema de novo.

- E aí o que aconteceu?

  Ela me olhou com seus olhos verdes, e foi como se ela estivesse me olhando através de sua meia máscara de Antígona, mas como se aqueles olhos verde claros fossem apenas uma parte diferente, mais profunda, da máscara.

- É impossível ouvir um poema sem que ele mude você - observou ela. - Eles o ouviram, e o poema os colonizou, tomou posse deles, e os habitou. Os ritmos do poema passaram a fazer parte do modo de pensar deles. Suas imagens transformaram para sempre as metáforas deles. Seus versos, seu modo de ver, suas aspirações se tornaram a vida deles. Depois de uma geração, as crianças já nasciam sabendo o poema, e logo, porque essas coisas são assim, já não nasciam mais crianças. Não havia necessidade delas, não mais. Só havia um poema feito carne que andava e proliferava por toda a vastidão do conhecido.

  Então ela se inclinou em minha direção e - acho que foi um beijo... acho. Bem, ela pressionou seus lábios contra os meus e, depois, satisfeita, recuou.

- Você quer ouvir? perguntou, e fiz que sim, sem saber direito o que ela estava oferecendo, mas convencido de que precisava de qualquer coisa que ela estivesse disposta a me dar.

  Ela então começou a sussurrar algo no meu ouvido. Isso é o mais estranho na poesia - dá pra saber que é poesia, mesmo quando é em uma língua que a gente não conhece. Você pode ouvir Homero sem entender uma palavra, e mesmo assim saber que é poesia. Já ouvi poesia polonesa, poesia inuíte, e eu sabia o que era sem saber. Seu sussurro era assim. Eu não entendia a língua, mas suas palavras me atravessavam, perfeitas, e em minha mente eu via torres de vidro e diamante, pessoas com olhos do verde mais pálido e, por baixo de cada sílaba, sentia o avançar sem trégua do oceano invencível.



Neil Gaiman (do conto Como conversar com garotas em festas), in "Coisa Frágeis"





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* e que fique registrada minha sugestão [lírica] para o fim dos tempos  - que tudo acabe em poesia. ** fotos Eric Cahan (from Sky Series Works).

Feeling this way today: Zou Bisou Bisou







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* "nesta terça, 13/11, dia de Marte, às 20h (horário de Brasília), a Lua encontra o Sol e dá início a uma nova lunação. poucos minutos depois do casamento do Sol com a Lua, temos o temido eclipse total do Sol. o Dragão (Nodos Lunares) abre a boca e engole o Sol. escorpião, o do violento ferrão, porta veneno. o veneno que mata também é o veneno que cura, depende da dose, como ensina a homeopatia e os que fazem autópsia. nos próximos 30 dias, há quem tomará do próprio veneno em taça de cristal. e me desculpem o tom dramático, é que a Lua está em Escorpião." (João Acuio** no vídeo, Megan -Jessica Paré - dança para seu marido Don, em cena de Mad Men 5.

sábado, 10 de novembro de 2012

A gente só queria ver o maldito mar



À nossa geração nunca nos foi permitido ver o mar pela primeira vez 
Ele sempre esteve adentro, reluzente, o grande igual que nós mesmos.

Rogamos tanto às noites que se faça novamente o escuro 
mas quando as preces são atendidas 
é só uma ilusão dos trouxas, uma ardentia nos olhos e
o mar esbraveja aqui dentro, monstro comedor de rocha

Já nascemos umas baleias mórbidas
pobres diabas afogadas neste papel de luz
E é tão mesquinho de pequeno o desejo

A gente só queria ver o maldito mar 
por favor, 
pela primeira vez.



Ana Rüsche, O Grande Plugue, in Nós que Adoramos um Documentário, 2010.  











* o Mumford and Sons é umgrupo indie-folk inglês recordista de prêmios (e já pintou por aqui.) o novo single Lover of the Light + o vídeo absurdo dirigido e protagonizado por Idris Elba valem o olhar até a última cena -  grandiosa! (Elba é a estrela dos seriados The Wire e Luther e também a aposta dos britânicos para viver o próximo 007. hum-hum, o primeiro ator negro a viver o personagem. leitmotiv ele tem: além de ator, também é DJ e produtor de artistas de hip hop).**  Ana Rüsche salva os dias das noites

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

O que a internet fez com a gente? [3]














    1. eu faria qualquer coisa pela internet
    2. tudo o que aprendi na escola eu poderia ter aprendido com a internet
    3. a internet é a melhor coisa que me aconteceu
    4. a internet faz-me rir como jamais alguém um dia pôde
    5. eu nunca abandonarei a internet
    6. se a internet fosse mulher eu comia!
    7. quando eu morrer, espalhem minhas cinzas pela internet




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    * trabalho instigante da web artist, Caroline Walp - o título, The best thing that has ever happened to me (a melhor coisa que aconteceu em minha vida) é uma das afirmações que eu mais me faço sobre a web. a outra é: a internet salvou minha vida.

     (nada a ver com isso. ou, talvez só um pouco...)

    ** e como é pra você? qual a sua relação com a internet? em que lugar ela está em sua vida? ainda existe a possibilidade de viver analogicamente?

    quarta-feira, 7 de novembro de 2012

    Da série Verdades Indissolúveis: Amar é... Lost


    "Uma mulher muito bonita me contava outra noite sobre Lost e sobre coisas supostamente difíceis de decifrar.

    No que sonhei, nesta mesma noite, com algo mais ou menos assim, repare: Amar é… Lost - começa cheio de perguntas e acaba quase sem respostas. Porque é ridículo que ainda tenha alguém sobre a face da terra que pense no amor como resultado, como algo saudável, como uma casinha longe do abismo.

    Amar é flertar com o despenhadeiro, é sempre uma habitação na encosta de um morro. Amar não é casa própria, consórcio, planejamento, carro ou bicicleta. O amor não precisa de quintal ou garagem. O amor não se guarda. Se for amor o ladrão não leva.

    Pra ter resultado, joga no bicho ou na megasena. Monta um negócio de lucros, um curtume, uma bodega sortida, uma padaria na rua da Aurora. Entra para a política, faça lobby, venda apólices, gado, adquira uma franquia da Casa do Pão de Queijo. Mas se queres amar, te juega, simplesmente, sem pensar no ponto futuro.

    Amar é o lindo negócio da inutilidade. Como o tal do fazer poético. Não serve para nada. É um oco de um tronco de ipê e um pássaro cantando dentro. Fazer um filho ainda não é o amor. Casar tampouco. A propaganda de Becel sem gorduras trans muito menos.

    Só existe amor no entorpecimento. Amor é se drogar juntos, sem necessariamente carecer de traficantes ou aviõezinhos. Amar, caro Sam Sheppard, é cruzar o paraíso. É ser vaqueiro e laçar a jukebox, a radiola de ficha, para impressionar a amada-problema. Amar não é com licença. Amar não é bons modos.

    Se você ainda não perdeu o sentido nessa aventura, sinto muito, precisa viajar léguas para chegar perto do que estou falando. Amar é um sítio ao qual não se chega com informações ou GPS.

    Replay, ao sonho: Amar é… Lost - começa cheio de perguntas e acaba quase sem respostas."


    Xico Sá, Amar é... Lost 





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    * crônica publicada no blog do autor: Modos de macho, modinhas de fêmea & outros chabadás, em 27/10/12 (este comentário, também veio de lá: agora, todo vez que ouvir ‘aquela vadia roubou meu namorado’, vou citar: se for amor o ladrão não leva).**na imagem, foto da série "Amor à Vácuo"; uma criação do artista japonês Photographer Hal, que embalou vários casais em plástico e retirou todo o ar, em uma tentativa de conservar as propriedades do primeiro encontro eternamente, ou pelo menos, que a sensação de idílio dure mais do que duraria se estivesse exposta ao ar rarefeito do mundo exterior. "Em produtos embalados a vácuo não há influências externas. Fungos e bactérias que poderiam deteriorar a mercadoria não sobrevivem à falta de oxigênio. Ou seja, tudo estaria à salvo para sempre, é o happy end tão amplamente divulgado pela cultura ao amor romântico". Para ver mais fotos sufocantes, vá por aqui.

    terça-feira, 6 de novembro de 2012

    O mar dos meus olhos



    Há mulheres que trazem o mar nos olhos
    Não pela cor
    Mas pela vastidão da alma
    E trazem a poesia nos dedos e nos sorrisos
    Ficam para além do tempo
    Como se a maré nunca as levasse
    Da praia onde foram felizes

    Há mulheres que trazem o mar nos olhos
    pela grandeza da imensidão da alma
    pelo infinito modo como abarcam as coisas e os homens...
    Há mulheres que são maré em noites de tardes...
    e calma




    Sophia de Mello Breyner Andresen, in Obra Poética




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    * nasci debruçada sobre o oceano. neste litoral que é meu lar e origem, para todos os lados que  se lance o olhar, a paisagem é sinuosa, orgânica e feminina. tão poderosamente feminina que aceita e acolhe os filhos que não são seus: a agressividade concreta das torres de edifícios; a devastação da mata, fauna e montanhas; a invasão da urbe e do turismo predatório. ainda assim, a natureza feminina e voluptuosa da cidade se impõe - basta perder o olhar por alguns minutos mar adentro e abrir-se para seus sons mais íntimos. Balneário Camboriú é uma mulher à toa. uma dama sem berço, sem educação e cultura. safada, libidinosa, despudorada... exibe, orgulhosa, seus excessos, celulites, estrias - e já entrada na maturidade - suas primeiras rugas e fios de cabelo branco. vende-se conforme a fome. de uns tempos pra cá, anda abusada: caaaara que só! tem exata noção de sua gostosura e do quanto ainda pode oferecer. e acolhe.

    ** o blogger tem sabotado o ou isto ou aquilo por estes dias. mais de uma vez tentei postar e fui sumariamente engolida pelo buraco negro onde choram amargamente  - e em vão! - as boas ideias primordiais. este poema, por exemplo, deveria vir após uma série com o tema identidade. o que somos? o quanto de nós é pensamento, sentimento, formação e ambiente - uma questão que me persegue e me consome. sem respostas e vencida pela frustração de reescrever o que foi perdido, decidi por atropelar a linha de raciocínio e postar o carro à frente dos bois. o restante, com sorte, virá depois.



    ***  imagens de Balneário Camboriú. acima, vista da Praia dos Amores, sobre o Morro do Careca. no topo da página, Praia Brava. Fotos: Raimundo Arrosi.

    domingo, 4 de novembro de 2012

    For my darling, I love you


    • clipe extraído do programa Welcome Elvis, para celebrar a volta aos palcos do cantor 
    • (Elvis deu baixa do exército americano em 1960).
    • Sinatra canta Love me Tender, do Elvis
    • e Elvis canta um trecho de Witchcraft, de Sinatra.
    • o vídeo é daqueles encontros raros - está tudo aqui: 
    • a voz precisa e o talento incontestável de Sinatra,
    • as caras e bocas + o topete + o sex appeal + a voz inconfundível de Elvis
    •  - sem dúvida, camaradas, essa "coisa" lhes pertence!



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    * este ano ainda não havia postado nenhuma homenagem de aniversário, mas de hoje não escapo: não só porque é o dia D da maior incentivadora deste espaço, mas especialmente, porque sou capaz de perder a amiga se deixo a data em branco (e isso seria o fim, o fim!). 
    Querida Maria Goreti, pode parecer que somos água e vinho, mas como Sinatra e Elvis, só o que basta é que saibam é que "we work in the same way, only in different areas..." 
    (para mim, basta somente que existas e que, sempre que possível, estejas por perto. 'cause my darling, I love you... and I always will!).
    (para o vídeo legendado, vá por aqui)

    Ninja


    - Eu sou um ninja.
    - Não, você não é. 
    - Você me viu fazer isso?
    - O quê?
    - Tá-dá!



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    * diante do dia lindo que nasceu, os posts sérios perderam a vez para este. irresístível, hã? pra começar a semana tranquilos e infalíveis, como Bruce Lee.

    sexta-feira, 2 de novembro de 2012

    A morte como conselheira


    Tudo quanto vive, vive porque muda, muda porque passa; e, porque passa, morre. 

    Tudo quanto vive perpetuamente — torna-se outra coisa, constantemente se nega, se furta à vida.

    A vida é pois um intervalo, um nexo, uma relação, mas uma relação entre o que passou, o que passará, intervalo morto entre a Morte e a Morte. 

    Bernardo Soares (Fernando Pessoa), Livro do Desassossego

    ...


    A questão não é a morte, mas a transformação: uma gota de chuva transforma-se em vapor, que passa a fazer parte de uma nuvem e cai em forma de chuva entranhando-se profundamente no solo, reemergindo como uma nascente borbulhante que se transforma num regato, depois num rio, que flui para o mar. Podemos dizer que a gota de água morreu? 

    Em cada estado, é a mesma gota de água numa expressão diferente. A ideia de que tenho um corpo fixo trancado no espaço e no tempo é claramente uma miragem se as gotas de água do meu corpo tivessem sido oceano, nuvem, rio ou regato na véspera. 


    A possibilidade de vidas infinitas se prolongarem para a frente e para trás é um conceito cativante: cada alma pode percorrer centenas de céus e de infernos. A morte é uma breve paragem numa viagem interminável da alma. 

                                                           Deepak Chopra

    ...


    O que é grande no homem, é que ele é uma ponte e não um fim: o que pode ser amado no homem, é que ele é um passar e um sucumbir. 

                                        F. Nietzsche, Assim Falou Zaratustra

    ...


    A vida é dialética, e por isso não é lógica. A lógica significa que o oposto é realmente oposto, e a vida sempre implica o oposto em si mesmo.

    Na vida, o oposto não é realmente oposto, mas complementar. Sem ele, nada é possível. Por exemplo, a vida existe por causa da morte. Se não houvesse morte, não poderia haver vida.

    A morte não é o fim e não é inimiga; pelo contrário, por causa da morte, a vida se torna possível. Assim, a morte não está em algum lugar no final; ela está presente aqui e agora.

    Cada momento tem sua vida e sua morte; senão, a vida seria impossível.


                                  Osho, Tao - Sua História e Seus Ensinamentos
      ...


    A conquista do medo da morte é a reconquista do prazer da vida. Apenas é possível vivenciar uma afirmação incondicional da vida depois que se aceita a morte não como o contrário da vida, mas como um de seus aspectos. Desde sua gênese, a vida está sempre protegendo-se da morte, e às portas da morte. A conquista do medo alimenta a coragem da vida.

                                           Joseph Campbell, O Poder do Mito

    ...


    O mundo é mágico. 

    As pessoas não morrem, ficam encantadas. 

    João Guimarães Rosa



    Presta atenção nas pausas, as pequenas,
    que inesperadamente o destino te concede.
    Um dia, "a-que-virá", surgirá assim.


                                                        Friedrich Doldinger

    ...



    Houve um tempo em que o nosso poder perante a morte era muito pequeno. E por isso os homens e mulheres dedicavam-se a ouvir a sua voz e podiam tornar-se sábios na arte de viver. 

    Hoje, o nosso poder aumentou, a Morte foi definida como inim
    iga a ser derrotada, fomos possuídos pela fantasia onipotente de que nos livramos de seu toque. Com isso, nós nos tornamos surdos às lições que ela pode nos ensinar. E nos encontramos diante do perigo de que, quanto mais poderosos formos diante ela (inutilmente, porque só podemos adiar) mais tolos nos tornamos na arte de viver. 

    E, quando isso acontece, a Morte que podia ser conselheira sábia, transforma-se em inimiga que nos devora. Acho que para recuperarmos um pouco a sabedoria de viver seria preciso que nos tornássemos discípulos e não inimigos da Morte.

    Mas para isso seria preciso abrir espaço em nossas vidas para ouvir a sua voz. Seria preciso que voltássemos a ouvir os poetas...


                                      Rubem Alves, A morte como conselheira



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    * não adianta se enganar: a morte nos move - assim como o sexo (a origem da vida e - há quem diga - la petit mort); o amor (a enganação da morte) e Deus (o eterno - a negação da morte). para mim, é um tema fascinante - vira e mexe aparece por aqui. especialmente quando chega novembro (tento, mas não consigo deixar de pautar-me pelas efemérides...). ano passado foram cinco posts sobre o assunto - A última viagem; Día de Los Muertos (sobre a maneira colorida e festiva que os mexicanos encaram a morte); "belissima creatura", um poema do poeta gaúcho, Leonardo Marona; o premiado curta de animação La Dama y la Muerte e uma visão muito particular da morte, Um movimento e uma pausa. este ano, os 'pratos' não ficaram prontos a tempo e só o que consegui foi juntar todas as ideias neste bandejão com a aparência de comida fria e despersonalizada de buffet... A morte sabe-me assim, também: não pede passagem, não é sempre refinada, não se explica e nem dá motivos. e de que adianta falar de motivos? às vezes basta um só, às vezes nem juntando todos... [José Saramago].



    e se rir desopila o fígado - este curta animado - mais um trabalho de formatura dos estudantes da The Animation Workshop - pode bem funcionar como digestivo para este sarapatel de letras  - e como lembrete: para alcançar a Valhalla, onde estão todos os fortes, os amigos, as riquezas e o néctar dos deuses, só "morrendo em batalha", ok? nada menos que isso...).

    quinta-feira, 1 de novembro de 2012

    La culpa de morirse es de quien se muere


    "Por eso la muerte es tan magnífica, porque no existe, porque sólo muere aquel que no vivió".





    Frida Kahlo




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    * "fazemos o que podemos com o que não podemos e não podemos mais fazer nada. importa muito pouco, na verdade, que falemos tanto, pensemos tão alto, se cá no raso nos afogamos com os mortos, porque não vemos mais amor entre os vivos". Leonardo Marona